domingo, 15 de setembro de 2013

subsolo


A certeza de caminhar para a morte lenta e gradual só não me consome porque o existir é mais profundo. A tal fuga se reitera em cada disco, em cada riso, e dá vazão para todo o possível guardado debaixo do cotidiano. Somos pontos e somos fogo e sobre o resto não me decido.
A certeza de que caminho para a morte é mais real quando contabilizo as perdas, mais viva ao ler diariamente a nossa lápide. Você está em todo passo que não dou e em toda pausa que pede um semáforo. Conto nos dedos os fins de semana que não me custam nada, embora pesados feito enchente. Não fico sempre assim, já dancei sozinha ao som de vinho, já me perdi por outros braços e becos desta cidade... como quem não guarda, já andei sem olhar pros lados. Metade teatro, metade diamante.
Se me arrependo é pela falta -- sempre é pela falta. Aprendi sim senhor, Drummond, que falta não é ausência; no entanto hoje não distingo eloquência de realidade, nem saudade de mágoa. Você foi e, sem estar, restei-me com outro estar: nem sei se teu, mas um além-ser. A dor pega de todos os alimentos, sozinha, paralelamente à vida automática debaixo deste céu. Ponho-a para dormir, durmo, pego o ônibus, vivo nas telas convivendo com o eterno peso, às vezes nem sensível; é aí que me sinto como quem anda para a morte, lívida e estrela num gosto só meu.

3 comentários:

  1. Por vezes tentei gritar um in(certa) sensação. Escrevi, dancei, pintei, desenhei, respirei bem fundo - até cogitei parar de respirar. Nada. Minhas manifestações artísticas não passaram de ensaios da tolice. Foi quando eu percebi que tinha morrido; tudo que me restava depois do fim sumiu. Tristeza, dor, falta, ilusão..desapareceram sem sequer um tapa de despedida. Sobrou algo sem nome, cheio de lembranças diárias e diferente da saudade - porque eu não queria de volta. Conclui que a próxima etapa é o tempo. Ele arrasta, não convida ou sugere nada. Parece que finalmente acertei, ele me trouxe até seu texto. De todas as possibilidades de extravasar essa coisa sem nome, não ousei a mais simples - e talvez por isso mais difícil de considerar: a casualidade de não ser somente e tão só meu. Uma voz agora diz ' É possível sobreviver na morte; para alguns um recomeço, uma vida pós qualquer coisa, mas para você e mais uns tantos desconhecidos... é morte mesmo. E daí? Você não consegue expressar porque simplesmente não é mais nada'.

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  2. E quando o fim não chega e, mesmo assim, já parece ter acabado? Era assim. O que fazia bem matava. Destruiu. Pra onde foi? Quem viu? Ninguém, nem eu. Eu que perdi ao deixar que fosse embora (sem sentir), ia a cada dia e o que eu estava fazendo enquanto isso? Sorrindo cegamente, sentindo cegamente. Algumas frases e versos só fazem mais sentido depois de um tempo. Você os lê e entende, sim. Mas, depois, alguns deles aparecem mais decifrados ainda, e vê o além do que tinha entendido. A vida traz novas visões a cada manhã. Morremos, sim. Mas renascemos.

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